domingo, 1 de maio de 2011

Amores: as delícias e as dores

Os amores servem como matéria-prima de músicas, filmes, livros, poesias, grafites, quadros e tantas outras manifestações artísticas e culturais. Embora todas essas formas de expressá-los possam torná-los mais próximos da realidade das pessoas, é no dia a dia que aprendemos as suas delícias e dores.

Parada no ponto de ônibus na semana passada percebi quando uma moça, com no máximo 20 anos, chegou próxima a mim e começou a soluçar ao falar no celular. Magra e com os cabelos encaracolados como eu, o choro dela era tão sentido que me penalizou.

Fiquei prestando atenção na conversa, que era sussurrada ao telefone. Claro, que o motivo era uma desilusão amorosa. Maquiada, com um vestido que acentuava a silhueta esbelta, e salto alto, ela contava à interlocutora que acabara de ver o namorado com outra mulher.

Nem me espantei. Vivi essa situação algumas vezes e sei quais são as cicatrizes que as traições deixam em uma pessoa. Ela relatava a amiga que fora fazer uma surpresa ao namorado, e encontrá-lo, sem aviso prévio, no fim do expediente do serviço dele, mas o rapaz saiu abraçado com uma moça que trabalha com ele no escritório.

O mundo da bela morena, literalmente, foi devastado pelo tsunami chamado traição. Ela contava a amiga que ficara sem reação enquanto o moço fingira que não a vira e entrara no carro da outra. A garota dizia que teve vontade de se jogar na frente do veículo, porém suas pernas ficaram presas ao chão, como se ela fosse uma árvore.

A cada cena da história, ela chorava com mais sofrimento. As mãos dela tremiam. Temi que a garota desmaiasse no ponto de ônibus. A menina estava tão frágil que poderia cair ali, tamanha era a sua dor e seu desespero.

Senti vontade de me aproximar e consolá-la. Queria compartilhar com ela as minhas experiências negativas com os homens. E posso dizer que, infelizmente, sou pós-graduada em canalha. Sei como um homem egoísta, e que vive histórias com várias mulheres ao mesmo tempo, é nocivo à saúde feminina.

Quase caminhei em direção a ela para dividir com a moça as vivências tristes de quem é traído e desprezado. Resolvi que seria demais para a jovem e também a mim remoer dissabores amorosos que devem ser esquecidos. Lembrar de homem que não presta é se torturar.

Meu gesto para auxiliá-la foi oferecer lenços de papel. Ela aceitou a ajuda e enxugou o rosto. Prometeu a amiga ao telefone que nunca mais voltaria a falar com o traidor e garantiu que daria a volta por cima.

Abrindo um parêntesis. A cada desilusão que eu sofria me lembro que cantava “Volta por cima”, interpretada com maestria pelo Noite Ilustrada. Outro hino para mim era “Olhos nos olhos” do Chico Buarque. Tem mais uma do Chico: “Apesar de você”.

Queria ter falado para aquela moça que a vida era curta demais para perder tempo com quem não consegue nem se amar e se respeitar. Levei muitos anos para entender essa regra básica. Entretanto, naquele momento de sofrimento, ela nem compreenderia. Preferi deixar que a vida a ensinasse. Só espero que ela colecione menos cicatrizes que eu.

E ainda que as marcas existam. Sempre vale muito investir em um amor. Eu nunca vou desistir daquela sensação frenética de coração disparado. A ansiedade de esperar o telefone tocar ou de ouvir o aviso da chegada de uma mensagem de texto. As flores, a cama, o vinho, a música cantada ao pé do ouvido. Não dá para passar a vida sem um amor, uma paixão ou um bom affair.