sábado, 11 de junho de 2011

Amar é...




Ainda lembro da minha coleção de figurinhas que traziam desenhos de um simpático casalzinho em diversas situações e estampavam frases que sempre começavam com “Amar é...”. As respostas eram as mais variadas, mas tudo era tão bonitinho, que uma adolescente como eu, naquela época, adorava colecioná-las.

Recentemente, recebi no email uma outra versão daqueles mesmos personagens. Mas eles foram um pouco modificados e já não eram tão inocentes quanto às figurinhas de papel que um dia guardei com tanto carinho.

Muitas vezes pensei na resposta que melhor exprimisse a minha opinião acerca do que é amar. Amar é um verbo que simboliza para mim carinho, afeto, respeito, alegria, companheirismo, reciprocidade, simplicidade, cuidado, compreensão, paz, tolerância e colaboração. Esses conceitos se aplicam a qualquer relação.

Quer sentimento mais nobre que o amor de uma mãe por seu filho? Ou de um casal verdadeiramente apaixonado? E de alguém que respeita e cuida da natureza ou de animais? Amor como o de pessoas que cuidam de desvalidos, maltrapilhos e doentes com enfermidades graves. Só um sentimento sublime explica essa doação.

Na última semana, em meio ao turbilhão de propagandas e apelos publicitários do Dia dos Namorados, uma cena no centro de Campinas me comoveu e mostrou como amar é um ato simples e incondicional. Não dá para representá-lo em uma caixinha com uma bela joia ou em um perfume de grife.

Os dias estão muito frios e dezenas de moradores de rua se unem em cobertas rasgadas jogadas pelo chão para aplacar a sensação causada pelas baixas temperaturas. Estava parada em uma esquina aguardando uma amiga e bem próximo havia duas pessoas encolhidas bem juntinhas dividindo um coberto azul velho.

A mulher negra, cabelo enrolado até a altura do ombro olhava para as pessoas que andavam apressadas fugindo do frio. Ela ouviu duas amigas comentarem sobre as opções de presentes para os namorados e falou com o companheiro que nunca havia recebido nada na data que celebra os apaixonados.

Ele chegou o rosto perto dela e também afirmou que jamais havia sido presenteado por uma mulher. Negro, barba por fazer e cabelos desarrumados, o homem completou que este ano seria diferente. Ela se virou e olhou para o rapaz assustada. Os dois pareciam um pouco alegres por conta de um trago de bebida.

O homem então disse que ela era o grande presente que ele tinha na vida. Lembro da frase como se a ouvisse agora: “Sou preto, moro na rua e não tenho um centavo no bolso, mesmo assim você me aceitou do meu jeito. Você é o grande presente que tenho na vida. Amo você, minha preta”.

Duas pessoas que não têm nem um teto para viver juntas, que compartilham da dureza das ruas e do preconceito de quem passa e as ignora, foram capazes de me mostrar o verdadeiro sentido do amor. Em meio a uma vida tão difícil, eles têm um ao outro. Chorei discretamente ao vê-los ali abraçados no chão imundo e envoltos a tanta ternura.

Os dois pareciam ter entre 25 e 35 anos. Também deviam ser catadores de produtos para reciclagem, pois havia um carrinho bem ao lado deles. O casal tinha ainda a companhia de um cachorro, que me pareceu bem tratado e que estava encolhido em uma outra coberta. Do jeito deles, o rapaz, sua companheira e o animal formavam uma pequena família.

Senti até uma pontinha de inveja (boa) deles. Nunca ouvi nenhum homem dizer que me amava com a convicção que aquele rapaz afirmara à sua amada. Tomara que eles sejam felizes juntos, mesmo com tantas adversidades e a vida rude das ruas.

Há dois meses, me comovi muito com um senhor de mais de 70 anos que eu vi pregando cartazes em um ponto de ônibus. Ele procurava pela mulher, também acima dessa idade, que sumiu de casa. Ela tem problemas mentais. Um pequeno descuido da família foi suficiente para que a mulher saísse sem rumo e não fosse mais vista.

O desaparecimento aconteceu no final do ano passado em um município próximo a Campinas e até agora ela não voltou para casa. Quando o vi colocando aquela folha de papel tão simples, fui perguntar sobre a mulher da foto. Ele não resistiu e começou a chorar.

O senhor de cabelos brancos, expressão de sofrimento no rosto e um olhar perdido, me contou que a esposa fora sua única namorada e que ela sempre sofreu de problemas psiquiátricos. Mas a situação piorou com a morte de um filho em um acidente automobilístico. Ela entrou em depressão e passou a não lembrar mais quem era e nem onde vivia.

Ele me disse que se sentia culpado pelo desaparecimento, pois o descuido dele, deixando o portão da casa aberto, foi o caminho da fuga da mulher. Apaixonado, ele contou como se conheceram, em uma pequena cidade do interior paulista, e lembrou as tantas alegrias que viveram juntos.

O senhor afirmava que morrera no dia em que a mulher sumiu. Ele disse que todos na família fizeram inúmeros esforços para encontrá-la, mas que até aquele momento ninguém sabia o paradeiro dela. Ele contou que a esposa é uma mulher de traços delicados, voz baixa e saúde muito frágil.

Sem conseguir segurar as lágrimas, ele me disse que sempre amara a mulher, e mesmo os poucos deslizes frutos de erros cometidos na juventude, nunca reduziram nem um milímetro o tamanho do imenso amor que sentia por ela. O senhor afirmou que não conseguia viver sem ela e que sonhava com o dia em que ela voltaria para casa.

Vi nos olhos daquele homem cansado mais que culpa. Vi uma solidão terrível. Ele me disse que daria a vida para abraçar novamente a mulher. O casal estava junto há mais de 50 anos. Depois de perder um tempo comigo contando a história deles, o senhor foi embora para continuar a sua incansável busca pela amada.

Torço para que a tenha encontrado. O cartaz não está mais no ponto de ônibus.

Essas histórias são o retrato que o significado do verbo amar nunca caberá em uma única frase.

domingo, 5 de junho de 2011

Santo Antonio, rogai por nós (os apaixonados)


Museu dedicado a Santo Antonio em Lisboa
O casal parado em um trecho da Avenida das Amoreiras, em Campinas, gesticulava freneticamente. A noite estava bem fria, só que o clima entre os dois tinha uma temperatura elevadíssima. Enquanto o rapaz, de pele morena e visual despojado, tentava abraçar a loira de curvas avantajadas, ela fugia e com dedo em riste vociferava sem parar.

Quantas cenas idênticas vi nas ruas de vários lugares por onde passei nos últimos tempos? Sempre fico imaginando qual seria o motivo da briga: ciúmes, traição, falta de dinheiro, desilusões, pouco amor, filhos, familiares, desencontros. Cada história tem seu enredo e apenas acompanho de longe o movimento dos casais.

Às vezes, até assisto de camarote a tragicomédia. No mês passado (maio de 2011), enquanto esperava pelo ônibus próximo a unidade do Sesc aqui de Campinas, compartilhei com outros passageiros uma confusão entre um triângulo amoroso.

Um jovem rapaz prestava explicações para duas mulheres, que cobravam do homem uma postura de “macho”, segundo a mais velha delas, que deveria ter mais de 30anos, e queriam que ele falasse com qual das moças ele iria ficar.

A mais nova, que deveria ter entre 20 e 25 anos, relembrava momentos que eles passaram juntos e dizia que o rapaz não poderia negar a ligação entre os dois. A outra, quase segurando o moço pelo colarinho, ressaltava que já os havia visto juntos outras vezes.

Ele pacientemente tentava responder a cada um dos questionamentos delas. Mas as mulheres não queriam ouvir nada. Uma falava mais alto que a outra e, praticamente, encurralavam o rapaz contra uma mureta. Infelizmente, não vi o fim desse filme. O ônibus chegou e eu parti.

Mas, se pudesse escrever um final, faria as duas mandarem ele às favas e mostraria para o mocinho que tratar o sexo feminino com desrespeito é um erro imperdoável. Nada melhor que o desprezo. Tenho amigos que sempre me aconselham a nunca “descer do salto”.

Difícil seguir à risca o conselho, mas dividiria com elas, nem que fosse na minha história imaginária, o prazer de um dia na vida mostrar a um espécime do sexo masculino que ele não é a pessoa mais importante do mundo e que qualquer mulher segue a vida muito bem sem ele.

O amor e os atritos andam, ultimamente, de braços dados. O que será que acontece com os enamorados? Não sou o melhor exemplo para tratar de um tema tão delicado, porém gostaria de compreender esse quadro. Com todos que converso sobre o assunto, a resposta é evasiva ou ampla demais.

A única afirmativa comum à quase totalidade é o desejo de viver um grande amor. Dia desse conversando com um amigo em um jantar delicioso, ele e eu chegamos à conclusão que há uma crise de intimidade, medo de assumir um relacionamento, venda da imagem que se está sempre disponível e falta de cumplicidade.

Paradoxalmente, vivemos um dia a dia tão corrido e complicado que um abraço carinhoso, um telefonema em uma tarde estafante e um bom cafumé no cabelo são os melhores remédios para estresse, chefe mal-humorado, dívida no banco e tantas outras questões menores, porém com importância exagerada no cotidiano moderno.

Ele me disse uma frase naquela noite que nunca vou esquecer: “Estou farto de amores com prazo de validade”. Pensar que na minha infância sempre projetei casar com 25 anos, ter um casal de filhos e viver feliz para sempre. O verdadeiro conto de fadas das mocinhas da minha época.

Quando cresci, escolhi outro caminho. Sou uma mulher independente, sem filhos, 20 gatinhos e uma cachorra vira-lata, uma família amada, amigos queridos, com quase 40 anos e solteiríssima. Tive inúmeras desilusões amorosas e ainda estou me recuperando da última delas. Nem por isso perdi a esperança e o desejo de viver um grande.

Na minha juventude, o caminho que as moçoilas acreditavam ser o mais seguro para alcançar a felicidade plena no amor era pedir, com fervor, ao santo casamenteiro: Santo Antonio. Algumas chegavam a maltratar o coitado fazendo simpatias, que segundo os mais entendidos, eram infalíveis. Nunca fiz nenhuma delas.

No próximo dia 13 de junho, daqui uma semana, o santo que nasceu em Lisboa (Portugal) e morreu em Pádua (na Itália) será celebrado por milhões de fiéis. Todos os anos como o famoso pãozinho de Santo Antonio, e, vez ou outra, também aprecio o bolo que leva a benção do santo. Dizem que é o doce um dos responsáveis por atrair casamento ou um amor.

Nos dias de hoje, só rogando mesmo a Santo Antonio para encontrar uma pessoa que queira ser mais que uma aventura de um mês ou um romance com “prazo de validade”. Quem sabe o santo interceda a favor de quem ainda acredita em amor e mande alguém que seja companheiro (a), amante, carinhoso (a), amigo (a), confidente, bem humorado (a), inteligente, cheiroso (a). Os defeitos a gente descobre depois.

Ah! Mais uma frase sobre relacionamentos para marcar no caderninho: Voltar com ex que não presta é igual tomar café requentado. Não tem mais gosto nenhum. A autora: Sheila Rosely, companheira de trabalho no jornal Correio Popular.