terça-feira, 15 de setembro de 2009

Amor incondicional



Era uma bela manhã de feriado, Dia da Independência, no ano de 1996. Acordei com a Cristina, minha irmã, informando que a Gorda, nossa gatinha de estimação, acabara de ser mamãe. O parto aconteceu na madrugada, e como toda mãe protetora, ela escolheu um lugar seguro para ter os seus rebentos. E nada mais adequado do que a cama da Cristina, que era a quem ela era mais afeiçoada.


Quando olhei vi aquelas três criaturinhas tão pequenas. Os olhinhos fechados, os narizes rosas e as bocas que não eram mais do que uma linha fina. Um dos bebês era malhado, com três cores - amarelo, branco e preto. O outro era branco com manchas amarelas e o último, e maior, era preto e branco.


Não dava para distinguir logo após o nascimento o sexo dos recém-nascidos. Em poucos dias descobrimos que eram três meninas. A malhada ganhou o nome de Mina. A branca e amarelo foi batizada de Polla e a branco e preto era a Tayla Júlia.


Morávamos em uma pequena casa no bairro Cidade Jardim, próxima a Avenida das Amoreiras e à Via Anhanguera, em Campinas. O lugar tinha apenas quatro cômodos, mais um banheiro e um quintal minúsculo. Mas nunca faltou nada para as nossas meninas.


Perdemos a Polla meses depois de seu nascimento. Ela simplesmente sumiu. A bela garota era a minha companhia das madrugadas, quando eu voltava da faculdade e ainda precisava fazer os meus trabalhos ou estudar para uma prova que aconteceria naquele dia à noite. Como trabalhava o dia todo, a minha vida não era fácil.


Fiquei muito triste quando a Polla desapareceu. Procuramos por ela, porém não a encontramos nunca mais. Mudamos de casa. Saímos da Cidade Jardim, endereço no qual pagávamos aluguel, e fomos residir em uma casa própria no Jardim Novo Campos Eliseos, lugar em que vivo até hoje.


Levar as meninas não foi nada confortável. Nessa época, a Gorda já tinha sido mãe pela segunda vez. Tínhamos também a Brigitte Caroline, que nasceu prematura e se transformou em xodó da família.


Ter que ir para um ambiente novo é sempre traumatizante para um gato. E a Gorda desapareceu durante dias. Quase morremos de preocupação. Ela era a matriarca das nossas meninas e não podia ir embora de repente. Dias depois, ela apareceu magra e abatida. Recebida de braços abertos, aos poucos ela se adaptou à nova casa.


A mesma atitude tiveram Brigitte Caroline, Tayla Júlia e a Mina. Mas como os corações aqui em casa são imensos, dia a dia fomos agregando novos gatinhos à família. Todos abandonados e de rua. Acolher mais felinos acabou irritando duas das meninas - Tayla Júlia e Mina - que decidiram passar mais tempo na casa de uma vizinha do que no nosso lar. Só apareciam vez ou outra para comer e dar o ar da graça.


A Mina adoeceu e morreu depois de ser mamãe pela primeira vez. Ficamos muito tristes com a partida dela e doamos os gatinhos. Foi muito doloroso a ida dela. Tayla Júlia continuava instalada na casa da Dona Alzira, vizinha que a tratava como membro da sua família. Até carne a danada ganhava da aposentada, que vivia sozinha.


Depois de muitos anos morando em duas casas, a Tayla resolveu voltar para o nosso lar. E a partir desse momento passou a dormir na minha cama todos os dias. A Tayla era uma menina grande, imponente, forte e muito sapeca. Sempre adorou ter um espaço só dela e não hesitava em me dar uma mordidinha de leve no pé ou um arranhão de alerta na perna quando sentia que eu invadia a sua área no colchão.


Aprendi a respeitá-la e ela se transformou na minha grande companhia todas as noites. Estivesse eu alegre ou triste, lá estava a Tayla do meu lado. Não interessava se chovia, fazia frio ou se estava aquele calor insuportável, a bela menina sempre ficava em um canto da cama.


Do colchão ela reclamava por comida; saía em disparada quando percebia uma briga de outros felinos no quintal e observava quem entrasse no quarto. Ouço até agora o som do miado sempre alto e cheio de vida da Tayla. Pena que neste ano, um dia após o seu aniversário, nós descobrimos que a minha menina está com câncer. O pior é que o diagnóstico foi desolador: não há mais nada a fazer, a doença está destruindo o seu fígado.


Como dói ver quem se ama simplesmente partindo sem que possamos fazer nada. Todos em casa cuidamos dela com o maior carinho, mas é duro vê-la dia a dia perdendo as suas forças. Aos 13 anos, ela já é uma anciã e está com a vida por um fio.


O que mais gosto nos animais, em especial nos felinos, é o amor incondicional que eles dão a quem cuida deles. A Tayla sempre esteve ao meu lado na cama de solteiro. Não importava se eu estava triste, feliz, aborrecida, de TPM, com insônia, morta de cansaço. Ela era minha companheira de todas as horas.


E não adianta imaginar que outro pode substituí-la, mesmo que em casa residam mais 20 felinos. Assim como aconteceu com as pessoas, não há como trocar simplesmente alguém que se ama por outro. Cada um dos gatinhos é especial e tem um encanto próprio. Eu os amo pelo seu jeito deles e a forma como interagem comigo. Olha que tem figurinhas de gênios difíceis e outras mais flexíveis.


Sei que a Tayla não tem muito tempo de vida. Gostaria de ter uma poção mágica para curá-la. Mas essa artimanha faz parte apenas dos livros infantis. Na vida real, a gente tem que aprender a lidar com a ausência de quem amamos. E pode até parecer exagero na visão de quem não tem animais, contudo a companhia deles deixa a gente muito melhor. Saber amá-los, respeitá-los e cuidar deles ensina muito sobre a vida.


Quero muito que a minha menina parta de forma tranquila e sem sofrimento. E sei que vai deixar muita saudade, como aconteceu quando a mãe dela e sua irmã foram embora. Da família que começou o nosso pequeno gatil só ficará a Brigitte, que nasceu prematura e quase morreu com apenas alguns dias de vida.


Te amo bela garota dos pelos brancos e negros.










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